Pesquisar este blog

segunda-feira, 5 de novembro de 2012


Volta ao lar

"Sigo sem medo pela trilha estreita. Corpo cansado, vermes a espreita.
Eu sei, fui eu que quis assim, pois tenho fé que o mundo é seu. Seja o que Você quiser...

Mesmo que o mundo diga não, se entregar não esta em questão.
Foco e força na missão, põe fé e o coração.

Seu riso não calarão, a luta nunca é em vão.
Há sempre uma solução... seja o que Você quiser!"
Terceira Safra - Seja o que Você quiser

No auge dos meus vinte e tantos, me via preso num hospital e isso me incomodava muito. A inquietude da juventude pulsava forte. Era angustiante a possibilidade de passar a Páscoa no hospital. Os grilhões que lá me seguravam, não podiam segurar minha mente... que em muitos momentos voava alto, buscando um pouco de liberdade. Queria trabalhar, estudar, sair, namorar... viver! E mesmo sabendo que aquilo era uma fase transitória e necessária para meu bem, foi muito difícil lidar com isso.

Lutar para não esmorecer. E essa luta foi travada dia após dia, pois devemos sempre manter a mente sã. Quem luta contra o Câncer deve, sobretudo, ter confiança. Que seja efeito placebo ou não, o importante é recuperar a saúde e a vida.

Após a boa notícia que o meu cateter já tinha chegado, os procedimentos foram tomados. Roupão vestido, boas energias trocadas com os meus e parti, mais uma vez, para o centro cirúrgico.  O implante do port-a-cath é através de uma micro cirurgia, sendo possível inclusive estar acordado durante o processo. Não tenho esse sangue frio e pedi para tomar o "boa noite Cinderela" após a anestesia.

Acordei na maca, meio dopado, mas bem. Apenas com a esperada dor. É algo totalmente suportável, porém me disseram que há pessoas que saem da cirurgia e já vão dirigir, por exemplo. Realmente não foi meu caso, senti um grande incomodo e andei curvado por alguns dias. Não conseguia sequer levantar o braço. Demorou para meu corpo se habituar com o cateter, porém hoje já nem o percebo. De qualquer maneira vale muito a pena para quem será submetido a tratamentos prolongados.

Já me alimentava bem, caminhava bastante e demonstrava uma ansiedade enorme por sair do hospital. Os médicos perceberam a melhora no meu quadro e na quinta feira começaram a falar em alta. Isso só abriu mais ainda meu apetite e humor, fazendo com que meu quadro realmente melhorasse. Foram inúmeras idas à capela ou aos outros andares para demonstrar que estava apto a voltar para casa.

Na sexta feira fui acordado por um dos enfermeiros informado a confirmação da alta médica. Mas nos casos de cirurgia do intestino, existe um procedimento padrão para confirmação da alta: a evacuacão. Como me alimentei muitos dias a base de líquidos, os médicos precisavam confirmar que meu intestino estava funcionando perfeitamente... e aí começou um momento engraçado no hospital. Eu estava doido para ir ao banheiro mas não tinha a menor vontade.

Liguei para minha namorada contando a boa nova. E acordei alguns amigos ligando cedinho e compartilhando a novidade também... Ficou combinado que meu futuro sogro iria me buscar, as malas já estavam prontas, mas ainda faltava ir ao banheiro. Tentaram me ensinar algumas técnicas, mas de fato não creio que nenhuma tenha funcionado. E, após o café da manhã, finalmente meu intestino cumpriu seu papel e deu sinal de vida. Nunca senti tamanha felicidade após ir ao banheiro!
Lembro até de ter convidado minha mãe para verificar o resultado final, como testemunha para eu ir embora... rs

Como ser humano, acredito que só aprendemos mesmo com a dor. Apesar do amor ser um ótimo método também, não o vejo como eficaz. Só sendo privado de muitas coisas que pude dar valor a elas. 

Me despedi dos médicos, enfermeiros e colegas de quarto. Junto com minha mãe e namorada, descemos as malas e tudo mais que usei para ocupar a mente. Desde uma pequena televisão,  emprestada por um grande amigo, até revistas que ganhei de amigos, namorada e do meu tio Zé. Outro grande amigo deixou seu psp comigo e um pequeno grande parceiro, o Renatinho, deixou seus jogos de psp também. Sei que tudo isso parece sem importância, mas no fundo foram todos esses pequenos mimos que me ajudaram a travar a luta para não desanimar. Infelizmente não era todo momento que poderia ter alguém lá do meu lado, para conversar e distrair... então deixo aqui meu muito obrigado a todos que, além de toda força, puderam também colaborar com uma dose de entretenimento enquanto estive internado, fazendo com que as horas passassem mais depressa.

Ah... que alegria descer todos andares do hospital! Que felicidade colocar toda bagagem no porta mala, sentar num banco macio e sentir o vento no rosto. Como foi bom rever o mundo lá fora, sentir o coração pulsar mais forte e intenso. Foi uma dose de vida...

E falando em vida, era sexta feira da Paixão... o dia que Jesus deu sua vida para nos salvar. Como já disse em outros posts, meu ano foi marcado por momento simbólicos. Descobri a doença no Carnaval e passei pelo deserto com Cristo. E agora ia embora do hospital, com a missão cumprida e todas notícias positivas... ganhei uma nova vida no dia que Ele dava a sua por nós. Para alguns pode ser besteira, mas tenho certeza que não...

Pude, enfim, dormir novamente na minha cama, almoçar a deliciosa comida da minha mãe, sentir o ar puro quando quisesse... voltei ao lar e isso não tem preço. Deus abençoe aqueles que são privados disso e aqueles que nem possuem um teto e uma família. É o que temos de mais precioso na vida: nossa mãe, nossa família, namorada, amigos e nosso lar. Aquele lugar que nos sentimos bem e a vontade.


"Cada dia longe é duro suportar, deixa a louça na pia que hoje eu mesmo vou lavar! 
Eu desci a ladeira pra ver o que tinha por lá e voltei pra poder te contar que eu sempre vou voltar...
Não há lugar melhor no mundo que nosso lugar..."
Projota - Desci a ladeira


Ainda precisava da ajuda da minha mãe ou namorada para tomar banho. Ainda sentia dores. Ainda tinha dificuldades em levantar o garfo para comer. Mas nada disso substituiu a alegria de passar a Páscoa em casa, poder comer chocolate, poder partilhar bons momentos com os meus. A guerra ainda teria muitos outros capítulos, mas o mais complicado tinha passado. Era hora de me preparar para o que ainda estaria por vir... No próximo post contarei sobre o congelamento de Sêmen e o começo da quimioterapia, ok? 

Terceira Safra - Seja o que Você quiser

quarta-feira, 17 de outubro de 2012


Anjos da terra

"Ainda o mesmo de outrora, buscando uma nova aurora. 
Agradeço a você que esta me ouvindo agora.
 Os minutos de sua atenção garantem minha gratidão.

Agradecemos a todos que nos deram amor. Pois nós sabemos quanto é caro o preço da dor.
Dê seu preço se acaso sua amizade tem valor... por teu apreço eu venho, trinco e pago quanto for!"
Contra Fluxo - Dê seu preço


Primeiramente peço desculpas pela minha ausência no blog. De maneira alguma ele foi abandonado... apenas passei por alguns momentos complicados que me impediram de continuar a Quimioterapia e também estive ocupado ajudando a organizar uma doação à orfanatos no Dia das Crianças.

Em seguida quero agradecer, de ante mão, a todos meus amigos que vem me ajudando nessa fase toda, da descoberta da doença até a operação ou agora mesmo no tratamento. Muito obrigado pela força, carinho, preocupação, atitude e atenção. Este será um post especial a todos que vem me carregando nos braços, junto com Deus, nessa caminhada que em outro momento parecia sem saída mas graças a vocês esta terminando da melhor maneira possível.

Por algum tempo acreditei que muitas pessoas que eu amo e sento afinidade de irmão mesmo tinha ido embora da minha vida. A correria, as responsabilidades, a distância... inúmeros fatores que afastam tantas pessoas e deixam aquele buraco na vida. Mas se a frase "Na doença conhecemos nossos verdadeiros amigos" é verdadeira, posso dizer com toda certeza que tenho muitos amigos! Aliás, prefiro chama-los de anjos... Tive Anjos do Céu me ajudando e tive Anjos da Terra também.

Desde a descoberta da doença pude perceber que não estaria sozinho nessa. Claro que minha família, namorada e minha fé em Deus eram meu combustível, mas para manter a mente sã, foi preciso muita conversa, muito apoio e muita atenção. E foi aí que meus amigos entraram. Confesso não sei nem por onde começar a contar tudo que fizeram por mim e tenho receio de citar nomes e acabar esquecendo alguém. Mas vamos lá!

Após o diagnóstico do médico, procurei não espalhar a notícia. Afinal, minha cabeça estava mais preocupada em pensar como seria todo esse processo, encarar de frente a possibilidade da morte do que preocupar os meus. Guardei por um tempo esse segredo, mas aos pouco fui revelando o que estava acontecendo, já que muitos amigos acompanharam o tempo em que estive muito mal e não sabia o que era.

E para minha surpresa, muitos amigos que a vida acabou separando, foram reaparecendo. Talvez quem nunca passou por algo do tipo não tenha a dimensão de toda força que existe numa simples conversa, num abraço ou mesmo em uma mensagem eletrônica.

Com a cirurgia marcada, foram várias visitas de incentivo e encorajamento. No dia da internação lá estavam amigos, família e namorada. E durante a semana de preparação, a primeira mobilização que me emocionou. Como estava muito mal, precisei tomar três bolsas de sangue. Em contrapartida o hospital solicita que arrumemos alguns doadores. Na verdade, como eles mesmo assumiram, infelizmente o banco de sangue segue em déficit, com poucos doadores. Algumas mensagens trocadas pelo facebook e lá estava eu contando com a ajuda dos meus anjos. Muitos ainda não sabiam o que estava acontecendo comigo mas o resultado foi espetacular! Mais de trinta pessoas doaram seu sangue para o hospital... amigos próximos, amigos distantes e alguns apenas conhecidos que mostraram o tamanho de seu coração. Fiquei surpreso e muito feliz em saber que, de certa forma, minha passagem no hospital já deixava frutos. Tais bolsas doadas serão de grande utilidade para outras pessoas e um dos casos posteriores já me mostrou isso.

Dias depois de internar e já em casa, uma amiga me liga, contando que o hospital tinha entrado em contato, pois ela tinha doado sangue e uma garota precisava exatamente do seu tipo sanguineo e não tinha mais no banco. E no dia seguinte a doação foi feita. A vida é uma imensa teia e indireta ou diretamente estamos ligados a pessoas que nem conhecemos. Não soube mais sobre o caso, mas torço do fundo do coração que a garota esteja bem. 

Pós operação as visitas se intensificaram. No mesmo dia que fui para o quarto já tive várias surpresas. Inclusive meu primo que veio do interior, direto do trabalho, para doar sangue e me visitar, voltando à estrada no mesmo dia. Tinha parentes também distantes, porém queridos. Incrível que, mesmo sem conseguir conversar direito por conta da anestesia e medicamentos, a troca de olhares dizia tudo. Era pura energia.

Nem preciso dizer que, com tudo que vinha acontecendo, apesar da minha força e resistência fora do hospital, lá dentro estava muito emotivo. E no primeiro domingo após operar veio outra demonstração de carinho dos meus anjos. De acordo as normas do hospital, podemos ter duas visitas ao mesmo tempo no quarto. Meus queridos estavam presentes em um número "um pouco" maior... quatorze! Como fiquei feliz com aquele quarto cheio de vida, carinho e esperança. Ali pude realmente perceber que não estava sozinho. Uma visita em especial me fez chorar bastante. A namorada de um grande amigo meu, que também vencera o câncer. Acompanhei a história dela de perto, me lembro do dia que ela foi para a mesa de operação com grandes chances de não voltar, lembro do meu amigo raspando seu cabelo, longo na época, em solidariedade a ela. Sua visita me deu mais coragem ainda, sabia que tudo isso iria passar em breve. Aliás, a visita de todos... pois em cada palavra dita, minhas energias eram renovadas.

Lembro de um telefonema muito importante, quando fui para o quarto, pós UTI. Assim que meu amigo/anjo atendeu, choramos na linha, emocionados. Não importa a idade, não importa o sangue... família é sintonia.

Internado já a duas semanas, sentia falta de sentir o vento na cara, do canto dos pássaros, da liberdade... e que felicidade ligar para meus amigos contando que estava de alta naquela sexta! Acordei um monte de gente, liguei a cobrar mesmo e foi muito bom compartilhar com todos aquele momento.

Depois de chegar em casa, muitas visitas e telefonemas. E como era bom surpreender os que me viam andando, firme e forte. Ficava feliz em perceber nos olhos de cada um a alegria de me ver bem, superando tudo.

Ainda explicarei a situação por inteiro em outro post mas, resumindo, aconteceu outro fato que marcou muito. Devido a Quimioterapia, talvez eu fique estéril por algum tempo ou para sempre. Foi um baque receber a notícia que talvez não pudesse ser pai, chorei muito e procurei uma solução. E o congelamento de sêmen foi a única saída que encontrei. Apesar de seu preço, meu futuro era mais importante, fui atrás e fiz o procedimento, mesmo sem saber ao certo como pagaria tudo aquilo, já que estava sem trabalho, meu pai tinha ido embora e não poderia contar com a renda nem com o incentivo dele. Sempre sonhei ter uma criança, ser pai é uma benção. E ao conversar com o meu sobre isso, não tive as respostas que esperava. Além da impossibilidade financeira, fui incentivado a nem procurar isso pois "ser pai nos dias de hoje era besteira". Não sei como será meu pensamento daqui cinco, dez anos... mas eu precisava ter a opção de ser ou não. 

E, para minha surpresa, meus amigos estavam cuidando de tudo. Sério, tem certas coisas que palavras não descrevem. Organizada por um anjo/irmão, foi feita uma vakinha para pagar os custos do congelamento e da Quimio, como transporte e alimentação. Em um dia muito especial, me convidaram para um simples encontro. Chegando lá, amigos anjos me esperavam, com comes, bebes e muita alegria. Não entendi direito na hora, pois tinha pessoas queridas que não via a tempos. E em dado momento me foi revelado a ajuda que eles conseguiram organizar. Talvez vocês nem saibam, mas no futuro, tenham certeza que meu filho terá muitos padrinhos, viu?!

Mais recentemente tive uma complicação durante as sessões de Quimio, e precisei ser internado novamente. Infecção no intestino, devido minha baixa imunidade. E a privação da minha liberdade, denovo, foi algo complicado de lidar. Um jovem, com tantos sonhos e desejo de lutar por eles, mais uma vez estava de mãos atadas. Realmente me abati. E não é que meus anjos deram seu jeitinho denovo? Um enorme carta de metro, com mensagens de incentivo e esperança... vou deixar para vocês imaginarem o quanto me emocionei com tudo.

E a ajuda de cada um continua sendo fundamental para minha recuperação. Muitas mensagens através da internet, telefonemas, visitas... tudo que vem sendo feito para me alegrar. Eu sou extremamente grato por tudo isso. Deus colocou vocês em meu caminho e o que ele une, nada separa.

Graças a vocês pude realizar muitos sonhos e só posso dobrar os joelhos e agradecer por te-los em minha vida. Que Deus retribua em dobro toda energia positiva presente em cada ação. Alguns doaram sangue, outros dinheiro, outros cartas e mensagens, outros abraços e carinho... mas acima de tudo me doaram esperança e fé na vida. Obrigado, de coração!


"Eu tive amigos de todos os tipos que se imagina. Eu tive irmãos de outras mães, que me aconselhavam. Uns como filhos, que se perderam em cada esquina. Outros como pais, que praticamente me bancavam.

Alguns sumiam por meses, mas eu sempre amei vocês, desculpa se eu disse isso poucas vezes... ou deixei meu ego me calar. Pena que alguns deles já não estão mais por aqui para poder me escutar.

Essa eu escrevi para meus amigos, por que quando perdi eles estiveram comigo. Quando eu cai, eles estiveram comigo. Então quando eu subir eles vão estar comigo também!

Meus amigos são a luz que me guia. Eles podem não saber mas eu devo a eles cada dia e cada novo plano. E só quem já teve uma família na rua vai entender o que estou falando!"

Rashid - Poucos e bons

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Operação, parte II

"É tu, Senhor, que me alimenta de amor e paz. Sempre me lembro de ti, mas hoje quis lembrar mais.
Eu muito peço, mas eu pouco rezo... quase nada oro. Eu recomeço e as vezes peco, por isso choro.

Tudo tem sua hora. Tudo vem no seu momento. Eu honro sua honra e sinto o seu sentimento. 
Conheço sua obra e sei que o negócio é sério. Não adianta quererem desvendar seu mistério.

Reflito isso tudo me olhando no espelho... e vejo que estou de pé, mas o coração de joelho!"
Max BO - Tu Senhor


Após acordar numa maca, em uma sala de espera, deitado, coberto e quase paralisado devido a anestesia, senti que a primeira etapa estava vencida. Não consigo me lembrar de muitos detalhes da tarde/noite de sexta, pois a operação e os medicamentos realmente nos dopam. Me lembro passando de maca pelo corredor onde estava internado, lembro ter acenado para minha mãe, namorada, Ana, tio e alguns amigos presentes. Mas sem condição de conversar. E a previsão de três horas na UTI se estendeu e passei mais de 24 horas por lá, voltando para o quarto somente na noite de sábado.

Minhas poucas lembranças da UTI não foram boas. Fui muito bem cuidado, sim. Mas é um lugar triste, preocupante. Eu estava incapacitado de quase todas minhas funções, sendo preciso que enfermeiras trocassem minha roupa, me lavassem e assim por diante. Acredito que cada vez que piscava, algumas horas se passavam. Lembro de gemidos, lamentações e uma triste notícia de falecimento, que agitou os enfermeiros e a toda a noite. Não conseguia mover as pernas direito, mas percebi que não estava com dreno, porém estava com uma Sonda vesical. Esse tipo de sonda é utilizada quando a pessoa não consegue controlar a saída da urina (anestesiado, por exemplo) e é ligada diretamente na bexiga do paciente e na outra ponta uma bolsa coletora.

Sonda Vesical

Confesso que é desconfortável. Os poucos movimentos que conseguia fazer sempre moviam a tal bolsa e me causavam certa aflição. Outra coisa que fui informado é que o cateter da anestesia peridural ainda estava instalado para caso eu sentisse dor. Quando recebi a notícia de que iria para o quarto, logo me entusiasmei e pedi para retirarem a sonda, pois incomodava muito. Apesar de certa resistência, pois a sonda só seria retirada quando estivesse no quarto, o enfermeiro decidiu me atender. A retirada é rápida, porém dolorosa! Após pedir para prender a respiração, a sonda é esvaziada (o tubo que entra pela uretra é inflado quando inserido) e puxada de uma vez... céus, que ardência! 

Após alguns minutos, me recuperei e aí veio outra parte dolorosa: retirar o cateter da anestesia. Na realidade não é uma dor, em si. Mas é muito aflitivo quando o enfermeiro puxa aquele "fio" que esta na sua medula e você sente ele descendo pelas suas costas. Enfim, estava pronto para ir ao quarto.

Anestesia Peridural

Chegando no quarto, sábado a noite, recebi algumas visitas. Meu primo, que viera de Taubaté, num bate-e-volta só para doar sangue para mim e me visitar, estava lá. Minha namorada também. Meu tio. Amigos. Mesmo sem conseguir conversar direito, pois estava exausto, foi muito importante vê-los lá. Era confortador. 

Na mesma noite, ainda tive que encarar a dor de me levantar para ir ao banheiro, já que pedi para retirarem a sonda. Começava a aprender mais algumas lições da vida, pois tive que encarar a vergonha e pedir pra minha mãe me acompanhar e me segurar, pois estava com medicamentos instalados na veia, dor e acabara de passar dois dias, praticamente, só deitado. Percebi que, independentemente da idade, somos dependentes de alguém, em algum momento. Graças a Deus tive minha mãezinha por lá, que não se importou com nada e me tratou da melhor maneira possível. Ela teve que me ajudar a tomar banho, me levantar e deitar, comer... realmente é uma situação ao qual não estava mais acostumado e tive que encarar. Encarar minhas limitações momentâneas, encarar vergonha, encarar que eu precisava mesmo desses cuidados. Embora minha recuperação tenha sido rápida, os dias demoravam a passar.

No domingo soube que a mobilização dos meus amigos tinha dado certo e que a doação de sangue tinha sido um sucesso. Como precisei de transfusão, o hospital pedia para que levasse, pelo menos, dez pessoas para doar. Enfermeiros relatavam que esse era um grande problema, o banco de Sangue vivia vazio e raramente algum paciente conseguia encontrar pessoas para doar. Pois meus amigos ANJOS provaram o valor da amizade e doaram mais de trinta bolsinhas de sangue. Pessoas próximas, pessoas distantes, amigos de amigos, amigos, namorada e até mesmo minha ex namorada. Todos, me provando quanto vale uma amizade, quanto vale se doar um pouco pela vida dos outros. Sim, aquelas bolsas não foram pra mim, mas tenho certeza absoluta que foram extremamente úteis para alguém. Vidas foram salvas graças aos anjos que quiseram me ajudar de alguma forma. Inclusive teve um caso muito especial, que algum tempo depois que já estava em casa, o hospital ligou para minha amiga Magna, que havia doado sangue, e disse que havia uma paciente muito mal, necessitando exatamente do tipo de sangue que minha amiga tinha e o hospital já não possuía mais no banco. Fiquei extremamente realizado em saber que, indiretamente, fui responsável por levar minha amiga para a doação e que por conta dessa doação, outra vida seria ajudada.

Realmente é um capítulo a parte a força e o incentivo que meus amigos vem me dando. No próximo post falarei exclusivamente disso. Muitas outras demonstrações de amizade vieram e só posso ajoelhar e agradecer ter minha família, minha namorada e amigos como esses. Se alguns dizem que passaria por tudo isso facilmente, pois sou jovem, tenho certeza que passei bem pois contei com o apoio de todos. O corpo jovem poderia responder bem aos procedimentos médicos, mas a mente estaria mal se não fossem esses anjos. 

Voltando ao domingo, tive outra demonstração do poder da amizade: Quase vinte visitas no mesmo horário. Foi uma bagunça tão gostosa, me deu tanta força, que lembro como um dos dias mais felizes que tive no hospital. Eu estava visivelmente sensível e chorei por diversos momentos... mas estava super contente. Eram muitos rostos familiares e fraternos. Teve até um amigo que acabou desmaiando, por já não estar muito bem e ter muita gente no ambiente... ê Caerê, viu?! rs...

Mas nem tudo eram rosas. A cirurgia foi um sucesso, não precisei da colostomia e nem de dreno. Tudo ok. Porém, tiveram que retirar metade do meu intestino devido a extensão do tumor: quase dez centímetros! Alguns médicos se mostravam preocupados e todos nós aguardávamos o resultado da análise patológica, que indicaria o estrago do tumor. Seria feito o estadiamento do câncer, para ver a penetração e possível metástase (novos tumores decorrentes do primeiro).

A aflição pairava na minha cabeça. De certa forma, metade do problema estava resolvido... mas... e se tivesse espalhado o câncer? E se minha luta não tivesse ainda nem começado? A probabilidade da morte nunca se fez tão presente na minha vida e isso me trouxe muita introspecção. Muitas dúvidas, poucas respostas... e só a certeza de que queria viver, buscar meus sonhos. Só não sabia como.

A conversa que tive com o Oncologista responsável pela análise não foi animadora. Pelo contrário. Sem ainda analisar tudo, mas com sua experiência, o Dr. procurou me preparar para o pior, que pela extensão do tumor, provavelmente ele teria se espalhado e que eu passaria por quimioterapia, talvez por um ano, talvez por dois... ou na melhor previsão, seis meses. Um dos momentos que quase desabei foi quando ele perguntou se eu queria ter filho no futuro, pois o tratamento possivelmente me deixaria infértil... Me sugeriu procurar uma clinica de reprodução humana, para congelar meu sêmen e assim garantir a possibilidade de ser pai. Porém o procedimento era muito caro e eu deveria me decidir logo.

O Dr. Tiago, a fim de não criar falsas expectativas, procurou me informar que talvez eu ficasse mais um mês internado, que talvez eu fizesse a primeira sessão de Quimio internado... e esse prognóstico me causou cala frios. Não aguentava mais ficar preso, não sentir o vento e o sol. 

Tais notícias bateram forte na minha mente. Não conseguir ser pai? Logo eu, que tenho tanto essa vontade? Foi difícil assimilar isso, além de um monte de coisas que tinha que me preocupar. Para auxiliar a cicatrização da cirurgia foi recomendado que eu caminhasse bastante e também usasse uma cinta cirúrgica, que protege os pontos evitando que eles estourem em caso de esforço físico, espirro etc. Minha namorada me comprou a cinta, que dá firmeza e confiança para se locomover. É altamente recomendável a todos que passaram por cirurgia no abdômen. Existe também modelos que protegem o tórax, entre outros.

Cinta cirúrgica

Mas passaram-se o domingo, a segunda... e na terça feira meus anjos passaram pelo hospital para me trazer as boas novas.

Primeiro um presente simbólico do meu amigo Leny, que junto com o Rafael e Tadeu, me visitaram nesse dia especial. Era um cordão, com alguns origamis pendurados e uma pedrinha em uma das pontas. Me falta memória para lembrar o nome, mas sei que junto com aquele símbolo, vieram as notícias boas. Nesta mesma terça feita, o oncologista passou para me avisar o resultado da análise patológica: Apesar do tamanho o tumor NÃO se espalhou. Na análise de mais de cinquenta linfonodos, todos negativos. Ali, eu nascia novamente.

Dessa vez eu chorava, mas de alegria. Não importava o tratamento, eu não tinha mais a doença comigo! Teria que tomar a Quimioterapia por seis meses, mas era um tratamento preventivo, que visa eliminar qualquer resquício não identificado da doença. Seria uma luta, mas o principal já estava vencido, graças a Deus! Apesar de grande, o tumor permaneceu apenas no cólon. E eu dava graças pela doença ter se manifestado, pois em questão de profundidade na parede do intestino, o tumor chegou ao nível T3. Mais um, questão de tempo, e ele invadiria outros órgãos... Segue um link com informações da tabela TMN, que classificam os tumores, nódulos e metástase: http://www.virtual.epm.br/material/tis/curr-med/temas/med3/t3b_2000/caso12/patoest.html

E as boas notícias não pararam por aí. Após uma visita da Dr. Cinara, chefe que me operou, ficou acertado que eu passaria por uma pequena cirurgia para implante do Port-a-Cath, cateter interno que usaria para tomar a Quimio, preservando assim as veias do braço e diminuindo a dor.

Port-a-Cath 

Port-a-Cath já instalado, puncionado, recebendo medicação.

Esse tipo de cateter é implantado debaixo da pele e tem ligação com algum acesso venoso melhor que as veias do braço, que comumente estouram e prejudicam o andamento do tratamento. No meu caso, o cateter foi ligado a uma veia do pescoço. Se tiverem alguma dúvida, me procurem que explicarei com maior prazer. O uso de um cateter interno é indicado para longos tratamentos e seu custo é um pouco elevado, porém consegui pelo SUS e acredito que todos deveriam conversar com seu médico para esclarecer e solicitar, caso necessidade.

Como o texto ficou muito longo, deixo para relatar o implante e a volta para casa no próximo post. Além de uma postagem especial para meus anjos/amigos... ;)


Max BO - Tu Senhor

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Operação, parte I

"Senhor Deus, nesta noite eu não queria pedir nada. Por que já pedi tanto e tanta coisa me foi dada.
Saúde pra correr e proteção pelas calçadas. Fui invisível para cada alma mal intencionada.

Mas nessa madrugada eu não me sinto bem. Todo mundo dormiu e eu preciso falar com alguém!
Esse silêncio me tira do trilho e ninguém melhor que o pai pra escutar o desabafo do filho.

Entendi o recado. Não sei o que fiz de mais pra ser tão bem cuidado, já estive todo errado, bolado de trocar os passos, quase caindo pro outro lado, mas sei que alguém me carregava nos braços.

Me ofereceram crime, só que eu recusei.
Me ofereceram farinha, só que eu recusei. 
Se a vontade era minha eu não sei.
Só sei que no vale da sombra e da morte eu fechei os olhos e passei.

Só tenho a agradecer por cada dia. E por me fazer maior do que qualquer problema.
Tem quem não acredita em ti, enfim... Eu acredito por saber que o Senhor também acredita em mim!

Eu não sou melhor do que ninguém não. Eu não mereço mais que ninguém não.
Só estou mantendo os meus passos no chão. 
Tudo que eu peço nessa noite é perdão, por que mil cairão mas eu não serei atingido!"
Rashid - Mil cairão



E era chegada a hora da verdade. De frente para meus medos, sem mais como fugir. Dia 25/03 meu grande amigo Caerê nos levou ao hospital. Eu, ele, minha mãe, Ana e namorada. A espera para internar foi de nada menos que sete horas!

Ansiedade, receio, medo, coragem, fé... uma mistura incrível de sentimentos. Nunca tinha passado uma noite sequer em hospital. Como seria? Já tinha sido avisado que operaria no dia 30/03 e fui antes para o hospital pois teria que ter um preparo, alguns cuidados e exames.

Pois bem, quando chegou minha senha, após preencher a papelada, quando coloquei a pulseira de paciente, quando me chamaram ao quarto e tive que me despedir... Acho que Deus segurou minhas lágrimas. Mas muitas delas ainda cairiam.

Só pude subir com minha mãe, que foi minha grande companheira. Dos treze dias internado, ela ficara comigo em onze. As vezes sem conseguir tomar banho, tendo que me auxiliar em todas tarefas, mal alimentada. O amor de mãe acho que é a maior manifestação de Deus. Só tenho a agradecer por essa guerreira ter deixado todas as lágrimas em casa e ter sido meu maior porto seguro. Nossos papeis se inverteram quando fui para o hospital. Eu, que estava forte, inabalável... desmoronei em alguns momentos. Estava muito sensível, chorava com qualquer mensagem, ligação. Já Dna. Fátima estava em um estado de fé e afeto que me dava uma força tremenda.

Durante os primeiros dias recebi inúmeras visitas de médicos de diversas especialidades e realizei muitos exames. O de sangue constatou uma anemia muito forte. Minha taxa de hemoglobina estava muito abaixo dos 13g/100mm3 de sangue (nos homens). Minha fadiga vinha do fato da taxa estar rolando por volta dos 6g, menos da metade do necessário. Isso justificava também minha aparência pálida.

Outro exame que realizei foi uma tomografia para ver aproximadamente a localização do tumor e seu tamanho. Realizei o exame com contraste, ou seja, era necessário tomar um líquido para que a imagem do exame "enxergasse" a região afetada. A preparação é demorada, pois foram dez copos do líquido meio parecido com soro, tomados um a cada dez minutos. Nesse meio tempo, lembro-me ter conversado com uma senhora que havia operado do coração. Foi mais uma das inúmeras histórias comoventes que ouviria por ali.

Tomografia computadorizada

Confesso que estava empolgado em fazer o exame. Afinal, sempre via essas máquinas enormes e tinha maior curiosidade em saber como funcionava. E após ingerir todo líquido, instalaram um soro em mim e eis que fui a sala do exame. Deitei-me e tive que ficar com os braços pra cima. A esteira que deitei atravessa a máquina por diversas vezes. Em um dos intervalos entre a "ida" e "vinda" da esteira, o Doutor presente na sala aplica o contraste no soro e aí a coisa fica estranha... 

Pelo menos no meu caso, após a aplicação do contraste, tive uma queimação muito grande. E o pior, começou nos braços e foi se intensificar numa região não muito confortável para nós homens... rs. Sorte não durar mais que dois minutos todo o processo. Tomografia feita, exames de sangue também, faltava o resultado cardíaco.

Quem me acompanhou nessa parte foi a Dra. Anna Luíza. Pelo pouco que conversamos, ela era nova lá, mas me tratou com muito profissionalismo e competência. Conduziu todos os exames e inclusive tive uma grata surpresa em um deles. Anos anos tinha diagnosticado uma hipertrofia na válvula mitral... algo considerado normal para atletas de verdade e domingueiros também (meu caso). Não era nada com que se preocupar devido o tamanho, mas requeria um certo acompanhamento. Mas ao realizar o eletrocardiograma, nada apresentei! A enfermeira responsável inclusive chamou sua superior para verificar e tivemos a feliz notícia que não tinha nada lá e meu coração estava ótimo!

Com o aval da equipe médica de cardiologia, faltava apenas um porém para ser operado: meu sangue. Com a anemia que estava não aguentaria uma operação. Seria muito arriscado então tive que receber sangue. Nunca tinha pensado a fundo sobre transfusão de sangue e nas vezes que tentei doar, sempre acontecia algo. Mas só vivendo isso pra entender a grandeza do gesto da doação de sangue.

Precisar tomar duas bolsas cheinhas daquele líquido vermelho, escuro, vistoso. Foi uma sensação a parte. Me questionava de quem poderia ser aquele sangue, se ele realmente era compatível com o meu para não dar maiores complicações, o que levou aquela pessoa à doação? Realmente foi algo diferente. Percebemos a importância de um gesto tão humano. Ao final do post enviarei o endereço e maiores infos sobre doação de sangue.

E não é que os efeitos da transfusão são instantâneos? Assim que terminei de tomar as duas bolsas, duas horas cada, já me senti mais disposto, levantei rápido do leito, dei uma volta no hospital... coisas simples que eu já não conseguia fazer com facilidade antes. Minha mãe diz que minha cor melhorou pouco depois, dava pra ver minhas orelhas vermelhas e alguma cor nos lábios. Isso tudo já era quarta feira... estava chegando a sexta da operação. Ao mesmo tempo que me sentia mais disposto, na quarta mesmo começou uma dieta para "limpar" o intestino. Somente comidas pastosas, muito líquido e uma grande dose de ansiedade. Nesta altura já estava confiante e empolgado em operar. Queria resolver logo aquilo, enfrentar de frente meu problema e trabalhar até chegar na solução.

Na quinta realizei um novo exame de sangue e minha taxa de hemoglobina subira para dez, o suficiente para realizar a cirurgia. A tarde os médicos vieram dar maiores detalhes e aqui cito algumas coisas que esqueci no último post: Meu tumor foi do lado direito do intestino grosso, o lado mais largo onde o tumor não atrapalha-ra a passagem das fezes. Quem tem o mesmo problema, mas do lado esquerdo, pode ter maiores complicações, pois o canal é mais estreito e o tumor poder obstruir o caminho, causando inchaços e, em casos mais grave, até mesmo acabar estourando o intestino.

Independente do lado, a operação consiste em retirar o tumor, cortando com margens os dois lados e depois costurando novamente as pontas. Se não consegui me expressar direito e vocês não entenderam, peçam que eu tento repetir de outra forma. Pois bem, as coisas não são tão simples assim. Nesse momento de "remontar" o intestino, pode acontecer das paredes internas não se juntarem muito bem ou demorarem para se fixar. Nesses casos existe a necessidade de realizar a colostomia e esse foi meu maior medo e motivo de muita oração.

Na colostomia, devido as duas partes do intestino não terem se juntado muito bem, exterioriza-se uma parte dele para a saída das fezes, que fica acumulada numa bolsinha. Realmente é algo que pode causar certos constrangimentos e durante um tempo passei com essa real possibilidade.

Bolsinha de colostomia instalada e estoque.

Não que não seria algo que não conseguimos lidar. A saúde vem antes de tudo. Mas para um jovem, com suas vontades, vaidades e inquietude, ter um cuidado todo especial e a possibilidade de situações desconfortáveis era algo muito pesado. Porém estava disposto a enfrentar tudo e espero que quem esteja passando por isso também não tenha tanto medo quanto tive e tenha forças para encarar qualquer situação que é para seu próprio bem.

Após da transfusão de sangue, recebi uma carta do hospital pedindo meu esforço para levar 10 pessoas para doar sangue, já que tinha utilizado o banco e sabíamos bem que o estoque é limitado. Com o pouco de crédito que me restava no celular, entrei na internet e mandei uma mensagem, via Facebook, para meus contatos... e aconteceu uma das maiores demonstrações de amizade que já tive, mas isso ficará para o próximo post.

E então chegou o grande dia. Coração a mil, ligações, mensagens, fé e ansiedade. Chegada a maca, tive que vestir aquele roupão que deixa a nádega de fora... mas o meu eu amarrei bem e isso não aconteceu, ufa! Nossa amiga Ana já estava no quarto e tenho certeza que foi o que ajudou para segurar as lágrimas da minha mãe... e as minhas também. Deitei na maca, nos despedimos com o coração pequeno e parti.

Durante a condução da maca, o enfermeiro foi conversando comigo. E por não focar no assunto da operação, tenho certeza que a intenção daquele anjo era só me distrair. Dali pra frente, outros tantos anjos trabalhariam para que tudo saísse bem. O caminho foi longo, mas não tenho certeza se ele realmente era ou se isso foi reflexo do filme que passava na minha cabeça. Dali algumas horas eu saberia o destino da minha vida e isso não era algo fácil de lidar.

Chegamos ao andar onde ocorreria a cirurgia, minha maca ficou na sala de espera e ali acho que fiz a oração mais sincera, humilde e forte da minha vida. Na cabeça o som do Rashid ecoando como mantra: "Proteja-me na hora da entrada, proteja-me na hora da saída... sei que perante ti eu não sou nada, mas que minha missão seja cumprida". E durante esse momento aconteceu algo que muitos duvidarão, mas minhas lágrimas agora escrevendo e meus pêlos do braço arrepiados são testemunhas do que vivi.

Como sempre digo, mil anjos me acompanharam nesses momentos todos. Amigos, familiares, namorada, médicos, enfermeiro e anjos divinos também. Minha maca se encontrava quase de frente para a sala de operação, separada por um corredor com elevadores no meio. Quem conhece hospitais ou até mesmo o próprio beneficência, sabem que os elevadores são hiper requisitados e com ascensoristas. E durante minha oração, minha vibração com o espiritual, ouço o barulho de quando o elevador chega ao andar. Como todas as outras vezes desde que estava ali, levantei a cabeça para ver se viria algum médico. Pois o elevador parou, abriu as portas e "ninguém" entrou ou saiu. E assim ficou por algum tempo... e ali vi que eram meus anjos chegando, para me consolar, guiar as mãos dos médicos e cuidar para que tudo desse certo. Foi uma sensação diferente, me sentia acolhido, resgatado...  e toda vez que lembro disso me emociono.

Como diz a música que abriu o post, não sei ao certo o que fiz para ser tão bem cuidado por Deus. Nem sei se mereço tudo isso. Pelo contrário, já fiz tanta coisa errada... mas senti de uma forma única o quanto ele esteve do meu lado nesse pior momento da minha vida. Só posso agradecer e ser fiel a ele, pois ele me carregou nos braços em todos momentos difíceis e estava comemorando comigo todas vitórias também.

Pois bem, outros dois anjos médicos foram me buscar, Dr. Felipe e Dra. Patricia. Chegando na sala de operação, além de alguns anjos desconhecidos, lá estavam outros anjos já citados aqui: Dra. Carina e Dr. Tiago, além da chefe de operação e não menos especial Dra. Cinara.

Troquei de maca, parei em uma bem justa ao corpo, que permitia uma maior aproximação dos médicos. Tive que ficar com os braços abertos, formando um cruz. O anestesista chegou e explicou como seria o procedimento. Primeiro eu tomaria algo para dormir durante toda operação e em seguida tomaria a anestesia peridural, que não chega a corrente sanguínea, mas inibe o cérebro de interpretar a dor e é instalada envolvendo a medula espinhal.

E assim que tomei o boa-noite-cinderela da medicina, após dois minutos, apaguei. Daí pra frente das cinco horas de cirurgia já não sei dizer o que rolou. De testemunhas só meus anjos doutores e meus anjos divinos, aos quais tenho certeza foram responsáveis pelas mãos dos médicos. Pouco antes da cirurgia haviam nos avisado que eu precisaria ter uma meia elástica anti trombose durante o processo e assim que parti para a sala de cirurgia minha mãe correu atrás para comprar, deixando com os doutores durante a cirurgia... mas, apagado, não vi quem a colocou e nem em que momento.

Essa meia é necessária devido o tempo que ficamos de repouso durante e pós cirurgia. A má circulação sanguínea nas pernas pode causar trombose, então se vai passar por isso, providencie de ante mão.

Meia elástica anti trombose.

Me recordo muit bem de quem foi a primeira pessoa que vi quando acordei e a primeira coisa que disse: "Dra. Patricia, eu estou com a bolsinha?". E para minha tranquilidade e felicidade, não estava! A primeira vitória já tinha sido dada e muita coisa aconteceria ainda. Mas por hoje, creio que já escrevi demais. No próximo post falarei da doação de sangue, uti, pós cirugia, o implante do port-a-cath e a volta pra casa. Por enquanto é isso... e muito obrigado pelo incentivo e carinho que vêem me dando. "Sua força é minha força"!



*Info sobre doação de sangue no Hospital Beneficência Portuguesa de São Paulo:
Para realizar a doação de sangue, é importante saber: 

Menores de 16 e 17 anos agora podem doar (mediante a presença dos pais ou responsável) 


• Ter entre 18 e 65 anos 

• Pesar acima de 50 kg 
• Estar alimentado 
• Estar sentindo-se bem 
• Ter dormido pelo menos 6 horas nas últimas 24 horas 
• Aguardar 2 horas após o almoço e 1 hora após o lanche 
• Estar em boas condições de saúde

Apresentar um documento oficial de identificação: RG(Registro Geral), carteira profissional ou carteira de habilitação.

Intervalo entre as doações de sangue: 

• Homens: 2 meses (4 vezes ao ano) 
• Mulheres: 3 meses (3 vezes ao ano) 

Não podem realizar a doação de sangue: 

• Quem teve Malária ou Doença de Chagas; 
• Quem teve Hepatite após o 10 anos de idade; 
• Quem viajou para área endêmica de malária há menos de 6 meses; 
• Quem recebeu sangue a menos de 1 ano; 
• Quem fez tatuagem a menos de 1 ano; 
• Quem utiliza drogas ilícitas; 
• Quem possui comportamento de risco para adquirir doenças

Local das Doações: 
Rua Martiniano de Carvalho, nº 1009 -Bela Vista/ SP Telefone: (11) 3505-6080 

Horário de Atendimento:
De segunda a sexta-feira, das 8h às 16h.
Aos sábados, das 7h às 14h. 

Informações:
Local - Beneficência Portuguesa de São Paulo -1º andar do Bloco I –Sala 133 Telefones: (11) 35051150 ou 3505-1158
E-mail - bsangue@bpsp.org.br 

Estacionamentos Gratuitos:
Rua Treze de Maio, nº 1854 –Bela Vista/SP
Rua Maestro Cardim, nº560 –Bela Vista/SP

terça-feira, 28 de agosto de 2012

Reflexões pré internação

"Já aprendi não olhar para trás e confiar no meu caminho a partir daqui. 
Mesmo que a estrada  seja perigosa e tão incerta... não me diga que chegou no fim!
Sou refém de uma simples decisão, que dilacera o coração.

Use seu coração como uma lança, pois um dia terá orgulho de dizer que lutou!
Preserve o que você avista, conserve o que você gosta, não seja pessimista se não a vida encosta.
Não seja um egoísta, não erre com quem se importa, não abaixe a cabeça se o não for a resposta."
Dr. Caligari (part. Terra Preta) - Não me diga que chegou no fim


Certas coisas na vida só aprendemos com a dor. Claro que o amor também ensina... o amor constrói! Mas, as vezes, precisamos desconstruir para entender melhor e assim aprendi muitas coisas no período pré internação para operar.

Sem conseguir subir minha rua sem ficar ofegante, sem conseguir me alimentar direito e perdendo 15kg, não conseguindo entender direito o que viria pela frente e precisando ficar (ou ao menos me mostrar) firme em casa, passei por volta de um mês de muita reflexão. 

Afinal, por que nos desgastamos tanto em trabalhos que não nos reconhecem? Por que afirmar que "preciso de todo meu salário (e muito mais)" se grande parte, para alguns, é só para suprir necessidades superficiais como festas, consumo desenfreado, vícios etc? Todos temos sim que nos divertir... é o mínimo. Trabalhar para viver e não viver para trabalhar. Porém, quando se perde quase tudo e volta-se a depender dos familiares aos vinte e quatro anos de idade, percebemos que nossa qualidade de vida deve estar acima de tudo.

Claro que é fácil falar isso agora e entendo a real necessidade de alguns. Porém adotei a ideologia de me colocar acima de coisas como trabalho e obrigações. Temos que nos amar e se tiver que escolher um emprego com uma remuneração menor, mas mais recompensador e saudável, escolha! Dinheiro é ótimo e esse papo de que ele não trás felicidade é balela. Ele trás sim. Mas com toda certeza, ele ajuda, mas não compra saúde nem amor. E na minha humilde opinião, a balança esta toda para o amor e saúde...

As vezes me via quase caindo na depressão. Com vinte e poucos anos, sem poupança, sem carro, sem casa própria... totalmente alheio ao padrão esperado e que tanto lutei para estar. Quem nasce pobre tem que vir com gana, pois já estamos em desvantagem. A vida não é corrida, nem campeonato... mas temos que trilhar nossa história e sem condições básicas fica muito mais difícil. Batalhei muito para não me enquadrar no padrão assalariado-infeliz e não permanecer na inércia do "está bom assim, não vou arriscar".

Graças ao apoio dos meus pais, pude me dedicar aos estudos. E tenho plena certeza que o que muda uma nação é a educação. Tive que correr atrás de uma bolsa para conseguir me graduar. Para me especializar fora do Brasil, também. Fui muito abençoado e me orgulho da minha dedicação. De certa forma acredita que poderia conseguir o que quisesse se mantivesse a gana de vencer. Mas... e agora?

Como seria se meu tumor espalhasse? Como encarar as férias forçadas, logo no momento que me sentia no auge? E se algo desse errado, como ficaria minha mãe? Minha família? Nunca a palavra morte passou pela minha cabeça como uma possibilidade real. E realmente não consigo responder essas dúvidas. Dias era otimista, dias pessimista. Mas botei na cabeça que só as coisas boas sairiam da minha boca. Lei da atração... eu queria viver! E quem luta por isso sabe que tudo mais parece pequeno.

Fui muito incentivado por familiares, amigos, namorada, conhecidos... Recebi uma força incrível e esse apoio me fortaleceu muito. Tinha a certeza que Deus estava do meu lado e comecei a contagem regressiva para internar, logo após confirmarem que seria dia 25/03/2012.

Era a hora da verdade. Nada mais importava, apenas que a operação fosse bem sucedida e o tumor totalmente retirado sem se espalhar. Não pensava na dor, não pensava nos cuidados pós operatório... só queria vida nova!

Dentre as pessoas que conversei antes de internar, alguns receios surgiram. Muitos irão contar casos de pessoas que o médico abriu e simplesmente fechou, devido a extensão do tumor. Vão lhe contar casos de falecidos, de erros médicos... tudo! Por favor, filtrem toda e qualquer coisa que possa lhe perturbar.
Num momento desse, precisamos estar focados. 

Em momento algum me questionei "Por que eu, Deus?". Assumi esse processo como uma missão. Longe de ser um mártir. Queria apenas viver e, dali pra frente, ser exemplo para outros jovens que passarem por um momento tão delicado. Não por achar bonito... mas por sentir falta de alguém nessa posição para me ajudar, alguém que tenha passado por isso e me contasse tudo.

Na verdade tive dois exemplos próximos, que me trouxeram luz e esperança. Guilherme do Segue-me e Rebeca. O primeiro, enfrentou essa barra aos dez anos. Leucemia, se não me engano, e diversas sessões de Quimioterapia. Mas o tratamento mudou muito e o meu seria diferente... precisava entender pelo que passaria. Só que mesmo com uma doença diferença, sua história me dava força. Já a Rebeca teve um tumor no cérebro e uma cirurgia hiper arriscada era necessária. Lembro-me de quando raspou a cabeça e seu namorado, meu grande amigo Rodrigo -que na época tinha cabelo longo; também raspou. Foi emocionante... e gratificante demais o resultado. Mesmo distante, torci muito por ela e mais pra frente contarei a emoção no dia em que ela me visitou no hospital. Embora tenham sido fundamentais pela força que me deram, faltava alguém que tivesse passado exatamente pelo mesmo problema.

Recentemente, com o blog, também pude conhecer a história da, agora, minha prima Débora. São pessoas que a história me trás a certeza que tudo é possível. E guardar minha história seria egoísmo também. Alguém... alguém que esteja passando por isso irá conhecer esse endereço, essa história. E talvez uma semelhança, uma palavra ou uma música ajude essa pessoa a se fortificar para enfrentar sua batalha. Quero ver vencedores, vida nova a nós!

Pós blog já tive contatos, relatos e histórias que fizeram valer a pena contar minha luta. Tenho planos para juntar esses anjos que passaram na minha vida e fazer acontecer algumas coisas como visitas aos enfermos e ajuda em equipamentos que o SUS não cobre, como a cinta pós operatória que minha namorada me comprou e muitos não tinham condição. Se quisermos uma mudança no mundo, temos que ser essa mudança. Estou cada dia mais firme nessa idéia e conto com vocês!

Hoje apenas relatei as dúvidas e angústias que vivi nesse período. No próximo texto contarei como foi ficar internado, a operação e seus resultados. Mais uma vez, obrigado pela força que vocês vem dado... se os textos demoram a sair, não se preocupem que não abandonei o blog. É que os textos tem que partir da alma, tem que vir a vontade e a inspiração juntas. Escrever por escrever eu nem teria começado.


Dr. Caligari (part. Terra Preta) - Não me diga que chegou no fim

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Diagnóstico e aceitação

"Mil pensamentos diferentes na cabeça, tentando me controlar fico cada vez mais confuso.
Vejo o sangue do inimigo derramado, nesse solo a minha vida é um livro e não tem páginas. Caminho atenciosamente pois eu sei que ali na frente eu posso me afogar nas minhas próprias lágrimas...
Eu dobro meus joelhos, olhando para as estrelas me concentro nessa minha oração e somente essa música expressa o que se passa pelo ritmo que esta meu coração.

Preciso ser maior que o cansaço pois eu vivo dia-a-dia nessa terra de gigantes, por mais que alcance essas metas, nunca se chega tão longe o bastante. O meu destino é tão distante, mas eu não caminhei o bastante durante a noite... eu vivo em guerra constante, por isso que eu sigo avante, levante e cante: A guerra é um bom sinal!"
Terra Preta (part. Projota) - A guerra


Mal se iniciou 2012 e eu já sentia algo diferente. Passei o reveillon na praia e parecia que o mar me dizia algo. Estava com meus queridos Caerê, Juliana, Fê, Tata e, claro, minha namorada Mizinha. Durante nossa oração conjunta, não conseguia dizer nada... apenas chorar e agradecer por eles estarem comigo. E eu nem tinha feito o exame ainda!

Já expliquei como foi o exame no primeiro post. Realizei a colono dia 02/02/2012 e peguei o resultado algumas semanas depois. Precisava levar o diagnóstico no gastroenterologista (responsável especializado em estômago e intestino) que o pediu. Porém, na hora de marcar a consulta, o médico só estaria disponível um mês depois.

Minha mãe, como uma leoa defendendo sua cria, causou uma grande discussão, alegando meu estado e urgência de resolver logo meu caso. Deus estava traçando minha trajetória aí, pois conseguimos marcar para a mesma semana com o Dr. Rafael (ex Cartão Cristão, hoje trabalha no HC de São Paulo).

A princípio a consulta começou mal. Tomamos um sermão do Dr., que dizia não ser ético abrir exames de outro médico e que ele não deveria atender meu caso. Porém sua indignação era com o convênio que marcou a consulta e não necessariamente com nós. Mas sua fisionomia e tom mudou quando abriu o exame.

Resultado: Grande lesão elevada circunferencial na flexura hepática. E a biópsia acusou: Andenocarcinoma invasivo ulcerado no Cólon. Na hora não entendi nada, inclusive um dia antes tinha dado uma espiada no exame mas não havia entendido.

"-Você esta com um tumor maligno. É câncer no intestino"

A frase parecia não ter sentido, entretanto minha mãe já desabava em choro no colo de nossa amiga e sempre presente Ana. Tentei manter a postura e continuei escutando as recomendações. Eu precisaria operar rapidamente e teria que buscar um hospital. Quem mora na Zona Leste deve conhecer o hospital Iva, Vila Alpina até mesmo o Ipiranga. Hospitais esse que já me acolheram em outros casos mais simples e que tive dor de cabeça para resolve-los. Falta investimento, equipamento, médicos... e a culpa todos sabemos de quem é, aliás as eleições se aproximam, não é?

Enfim, por alguns segundos fiquei realmente preocupado de onde ficaria. Eis que o Dr., mais um anjo nesse meu caminho, disse ter amigos no Hospital Ipiranga e no Beneficência Portuguesa de São Paulo. Não tivemos dúvidas em pedir para entrar em contato com a equipe da segunda opção, pois meu tio Zé já havia operado do coração por lá e disse ter sido muito bem tratado.

O médico anotou nossos telefones, nos mandou para casa e disse que entraria em contato assim que conseguisse falar com seus amigos.

Ainda lembro do abraço triplo que demos ao sair da sala de consulta e lembro ter enxugado muitas lágrimas da minha mãe, segurando as minhas para não deixa-la pior. Durante todo caminho foi assim. E a Aninha tentando acalma-la e me consolar ao mesmo tempo. Pois bem, me mantive forte e até hoje, em nenhum momento, perguntei a Deus "por que eu?". Aceitei meu destino e me segurei. Porém nenhuma força do mundo seria possível de evitar as lágrimas que soltei, ao contar para minha namorada a notícia.

Enquanto minha mãe e a Ana desceram em casa, fui direto para casa da Mizinha contar-lhe todos os detalhes. E nesse momento chorei. Como criança, como pequeno... Tive medo da reação dela, do nosso futuro ser abalado, do meu próprio futuro. Porém, foi o momento que eu precisava chorar. Depois dali, minhas lágrimas demoraram um pouco para cair. Positividade foi o lema, pois eu sabia que se me entregasse, minhas chances cairiam muito.

Nesse meio tempo tivemos a notícia que a casa em que morávamos tinha sido vendida e que precisaríamos mudar em breve. Mais um choque... morei lá desde que nasci. E não era um momento propício para nos concentrar em outra coisa.

Pois bem, chegado meu aniversário, dia 13 de março, comecei a sentir a força da amizade. Já acordei ganhando uma bela cesta de café da manhã, primeiro presente da namorada. Muitas ligações, mensagens, emails... tudo me nutrindo e confortando. A noite, um pequeno bolo para quem compareceu e a certeza de que eu, minha mãe e minha avó (Dona Norma) não estaríamos sozinhos nessa.

Começo do meu dia. Não poderia ser melhor, Mizinha! 

Tiago Xisto, Mizinha, Caerê e Ju. Alguns dos meus mais preciosos anjos. 

Avó Norma e Mãe-leoa Dona Fátima

Voltando ao dia da notícia, recebemos a ligação do Dr. Rafael e, para nossa felicidade, ele conseguiu nos encaminhar para a equipe PROGASTRO. Precisei pagar uma consulta no valor de R$300,00 e passei com dois doutores marcantes na minha vida: Dra. Carina Fernandez e Dr. Tiago Szego. Apesar de parecer salgado, o valor foi o melhor investimento que já fiz para minha saúde. Dias antes uma grande amiga, Tânia, havia me recomendado orar para que meus anjos fossem encontrar os anjos dos médicos que me atenderiam... e de fato creio que isso aconteceu.

Os dois me tiraram todas as dúvidas, explicaram e tranquilizaram. Disseram que não é algo que se escolhe, mas se pudessem escolheriam um tumor nesse exato lugar que eu tinha, pois era mais fácil tratar e se curar plenamente. Foram verdadeiros anjos, me dando uma força tremenda e sei que sempre serei grato por isso.

Foi encaminhado, então, meu pedido de internação pelo SUS, pois é nosso direito de cidadão e já comecei a aguardar ansiosamente para resolver tudo.

Por hoje fico por aqui. Ainda tenho muito o que falar sobre meus amigos/anjos, família, operação, quimioterapia e congelamento de sêmen. Mas cada coisa a seu tempo.

Obrigado pela incentivo nos comentários e nas redes sociais. Como costumo dizer, sua força é minha força!


* A quem possa interessar, segue os contatos da clínica PROGASTRO:
Rua Martiniano de Carvalho, 927 - Bela Vista - São Paulo
Fone/faz: (11) 3287-1007 / 3251-3822 / 3251-3043
Email: pro-gastro@bol.com.br


terça-feira, 14 de agosto de 2012

Prólogo

Todo começo é difícil e com um blog não seria diferente. Não que eu não tenha vivência na internet, mas o tema é delicado. Expor meus pesares não é algo que estava nos planos. Mas como disse minha prima-irmã-meiomãe Patrícia, eu não poderia deixar de ajudar os outros... seja com alguma informação, com meu relato ou mesmo em uma troca de emails, que deixei público para os interessados em conversar sobre o câncer e como lidar com tudo que a doença envolve. Não sou um especialista, mas não apenas li sobre... eu vivo isso. 

Vou dividir toda história em várias postagens. No atual momento, já conclui um dos três ciclos de Quimioterapia, mas irei escrever sobre todo processo: da notícia à operação e tratamento.

Em um ano minha vida mudou muito. Em todos sentidos. Em junho de 2011 estava me formando na faculdade. Toda correria para o TCC, trabalho entregue com louvores, elogios, criticas e muita satisfação em ter feito tudo da melhor maneira possível, juntamente com todo grupo Calibre. E junto com todo esse momento, a expectativa da primeira viagem internacional: Juntamente com um colega de grupo, Tadeu Zvir, ganhamos uma bolsa para estudar no exterior. Que alegria e que ansiedade também, pois embarcaríamos logo em seguida de pegar o diploma, em Julho/2011. Até aí era apenas um mix de boas novidades.

A imagem de fundo do blog foi tirada durante a viagem. Foi no Cabo da Roca, Lisboa. Fomos lá para estudar, mas a maior bagagem não encontramos em livros e aulas. Neste lugar, o ponto mais ocidental da Europa, me senti mais próximo de Deus. Hoje talvez não tenha uma religião definida, mas independente de como queiram chamar, eu sinto muito forte a presença divina em minha vida. Lá pude perceber sua perfeição, borrando o horizonte, misturando o mar e o céu. Foi um momento marcante.

Até então, só coisas boas. Não tenho o que reclamar, ao contrário, só agradecer. Mas esses dois grandes momentos se juntaram com outros e transformaram o período de 365 dias no ano mais agitado e marcante da minha vida.

Durante a viagem, um grande amigo, Tiago Xisto, nos ofereceu vaga em uma agência e assim que voltamos já começos a trabalhar. Foi ótimo para equilibrar as finanças, mas comecei já cansado. "Tudo bem", pensava,  preciso disso. 

Paralelo a isso, meus pais estavam em processo de separação. Claro que, com 23 anos, isso seria mais fácil de lidar do que mais novo. Porém, não existe idade para sentir saudade e com a maturidade não podemos ignorar atitudes, se posicionando. Até hoje não entendo direito o que levou meu pai a se distanciar tão repentinamente e escolher outra família. Ele, Bonny, foi embora para outra cidade e temos contato casualmente, entre uma mensagem ou outra nas redes sociais, sms ou entre suas únicas duas visitas em um ano. Entendo sua dificuldade financeira, mas no momento que mais precisei, o senti ausente. E minha mãe, dona Fátima, virou meu pai também... se tornando uma grande guerreira!

Pois bem, lamentos a parte, voltemos ao que interessa. Segui trabalhando na agência, os meses foram se passando e algo começou a mudar: comecei a passar mal constantemente. Febre, vômito, diarréia, fraqueza... a princípio fui medicado apenas por conta de uma anemia forte. Depois, com a continuidade dos sintomas, tomei remédios para virose e mais um monte de doenças que foram sendo descartadas. E continuava mal. Graças a um médico do convênio popular que temos, Cartão Cristão, foi pedido um exame mais aprofundado: Colonoscopia.

Foi um choque. Infelizmente me encontro numa cultura um tanto machista, onde tal exame é veemente repudiado. E não é um julgamento social, digo por eu mesmo, que me questionei muito antes de aceitar realizar a colono. Mas me encontrava num estado tão mal, que decidi encarar qualquer coisa que pudesse solucionar meu problema. 

Eu subia a rua de casa e já me cansava demais. Não tinha mais pique pra nada e as faltas no emprego eram constantes. Já não sabia mais o que dizer e estava prestes a pedir as contas, quando em Dezembro/2011 os sócios decidiram fechar a agência. Fiquei triste pelo futuro que eles poderiam ter perdido, mas de certa forma aliviado por não fugir do compromisso e então ter um tempo para me cuidar.

Final de ano é muito complicado depender de saúde pública e até mesmo privada, sendo que meu exame consegui realizar somente em Janeiro/2011. Antes, em Dezembro, passei muito mal e fui a Santa Casa. Quase me operaram por apendicite (?!), mas no fim tomei apenas um soro com analgésico e ficaram de me avaliar, era só marcar a consulta. Pois bem, para passar com o clínico geral a espera era de três meses. Com um gastro (responsável por cuidar de todo sistema digestório) a espera era de um ANO.  Sorte minha ter o pequeno convênio a qual sou muito grato, pois sempre atenderam com carinho e respeito.

Como já disse, em Janeiro/2011 realizei o exame. Para quem vai realiza-lo também, fica algumas dicas: fique tranquilo. O exame é indolor. Assim que cheguei ao local, fui direcionado a uma sala, onde troquei a parte de baixo da minha roupa por um roupão de hospital, tomei um líquido para dormir e apenas deitei de lado. O resto foi um segredo, pois só me lembro hora que acordei, já vestido e sentado em uma cadeira. Apesar de algumas piadinhas de mal gosto e do inevitável constrangimento ao contar, sou grato a medicina, pois sem esse exame meu quadro poderia ter se agravado muito.

Por hora creio que já escrevi muito. Já dei um quadro geral da minha situação naquele momento e no próximo post conto os detalhes do resultado, como enfrentamos a notícia, a importância da minha namorda, Marina, e de todos meus amigos, agora anjos na minha vida.

Deixo uma música que foi minha trilha sonora durante esse período até a operação. Sua letra diz muito, me deu forças e até hoje me emociono ouvindo. Como diz a letra: "Não tente entender, só sinta..."


Rashid (part. Flora Mattos) - Que assim seja