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sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Operação, parte II

"É tu, Senhor, que me alimenta de amor e paz. Sempre me lembro de ti, mas hoje quis lembrar mais.
Eu muito peço, mas eu pouco rezo... quase nada oro. Eu recomeço e as vezes peco, por isso choro.

Tudo tem sua hora. Tudo vem no seu momento. Eu honro sua honra e sinto o seu sentimento. 
Conheço sua obra e sei que o negócio é sério. Não adianta quererem desvendar seu mistério.

Reflito isso tudo me olhando no espelho... e vejo que estou de pé, mas o coração de joelho!"
Max BO - Tu Senhor


Após acordar numa maca, em uma sala de espera, deitado, coberto e quase paralisado devido a anestesia, senti que a primeira etapa estava vencida. Não consigo me lembrar de muitos detalhes da tarde/noite de sexta, pois a operação e os medicamentos realmente nos dopam. Me lembro passando de maca pelo corredor onde estava internado, lembro ter acenado para minha mãe, namorada, Ana, tio e alguns amigos presentes. Mas sem condição de conversar. E a previsão de três horas na UTI se estendeu e passei mais de 24 horas por lá, voltando para o quarto somente na noite de sábado.

Minhas poucas lembranças da UTI não foram boas. Fui muito bem cuidado, sim. Mas é um lugar triste, preocupante. Eu estava incapacitado de quase todas minhas funções, sendo preciso que enfermeiras trocassem minha roupa, me lavassem e assim por diante. Acredito que cada vez que piscava, algumas horas se passavam. Lembro de gemidos, lamentações e uma triste notícia de falecimento, que agitou os enfermeiros e a toda a noite. Não conseguia mover as pernas direito, mas percebi que não estava com dreno, porém estava com uma Sonda vesical. Esse tipo de sonda é utilizada quando a pessoa não consegue controlar a saída da urina (anestesiado, por exemplo) e é ligada diretamente na bexiga do paciente e na outra ponta uma bolsa coletora.

Sonda Vesical

Confesso que é desconfortável. Os poucos movimentos que conseguia fazer sempre moviam a tal bolsa e me causavam certa aflição. Outra coisa que fui informado é que o cateter da anestesia peridural ainda estava instalado para caso eu sentisse dor. Quando recebi a notícia de que iria para o quarto, logo me entusiasmei e pedi para retirarem a sonda, pois incomodava muito. Apesar de certa resistência, pois a sonda só seria retirada quando estivesse no quarto, o enfermeiro decidiu me atender. A retirada é rápida, porém dolorosa! Após pedir para prender a respiração, a sonda é esvaziada (o tubo que entra pela uretra é inflado quando inserido) e puxada de uma vez... céus, que ardência! 

Após alguns minutos, me recuperei e aí veio outra parte dolorosa: retirar o cateter da anestesia. Na realidade não é uma dor, em si. Mas é muito aflitivo quando o enfermeiro puxa aquele "fio" que esta na sua medula e você sente ele descendo pelas suas costas. Enfim, estava pronto para ir ao quarto.

Anestesia Peridural

Chegando no quarto, sábado a noite, recebi algumas visitas. Meu primo, que viera de Taubaté, num bate-e-volta só para doar sangue para mim e me visitar, estava lá. Minha namorada também. Meu tio. Amigos. Mesmo sem conseguir conversar direito, pois estava exausto, foi muito importante vê-los lá. Era confortador. 

Na mesma noite, ainda tive que encarar a dor de me levantar para ir ao banheiro, já que pedi para retirarem a sonda. Começava a aprender mais algumas lições da vida, pois tive que encarar a vergonha e pedir pra minha mãe me acompanhar e me segurar, pois estava com medicamentos instalados na veia, dor e acabara de passar dois dias, praticamente, só deitado. Percebi que, independentemente da idade, somos dependentes de alguém, em algum momento. Graças a Deus tive minha mãezinha por lá, que não se importou com nada e me tratou da melhor maneira possível. Ela teve que me ajudar a tomar banho, me levantar e deitar, comer... realmente é uma situação ao qual não estava mais acostumado e tive que encarar. Encarar minhas limitações momentâneas, encarar vergonha, encarar que eu precisava mesmo desses cuidados. Embora minha recuperação tenha sido rápida, os dias demoravam a passar.

No domingo soube que a mobilização dos meus amigos tinha dado certo e que a doação de sangue tinha sido um sucesso. Como precisei de transfusão, o hospital pedia para que levasse, pelo menos, dez pessoas para doar. Enfermeiros relatavam que esse era um grande problema, o banco de Sangue vivia vazio e raramente algum paciente conseguia encontrar pessoas para doar. Pois meus amigos ANJOS provaram o valor da amizade e doaram mais de trinta bolsinhas de sangue. Pessoas próximas, pessoas distantes, amigos de amigos, amigos, namorada e até mesmo minha ex namorada. Todos, me provando quanto vale uma amizade, quanto vale se doar um pouco pela vida dos outros. Sim, aquelas bolsas não foram pra mim, mas tenho certeza absoluta que foram extremamente úteis para alguém. Vidas foram salvas graças aos anjos que quiseram me ajudar de alguma forma. Inclusive teve um caso muito especial, que algum tempo depois que já estava em casa, o hospital ligou para minha amiga Magna, que havia doado sangue, e disse que havia uma paciente muito mal, necessitando exatamente do tipo de sangue que minha amiga tinha e o hospital já não possuía mais no banco. Fiquei extremamente realizado em saber que, indiretamente, fui responsável por levar minha amiga para a doação e que por conta dessa doação, outra vida seria ajudada.

Realmente é um capítulo a parte a força e o incentivo que meus amigos vem me dando. No próximo post falarei exclusivamente disso. Muitas outras demonstrações de amizade vieram e só posso ajoelhar e agradecer ter minha família, minha namorada e amigos como esses. Se alguns dizem que passaria por tudo isso facilmente, pois sou jovem, tenho certeza que passei bem pois contei com o apoio de todos. O corpo jovem poderia responder bem aos procedimentos médicos, mas a mente estaria mal se não fossem esses anjos. 

Voltando ao domingo, tive outra demonstração do poder da amizade: Quase vinte visitas no mesmo horário. Foi uma bagunça tão gostosa, me deu tanta força, que lembro como um dos dias mais felizes que tive no hospital. Eu estava visivelmente sensível e chorei por diversos momentos... mas estava super contente. Eram muitos rostos familiares e fraternos. Teve até um amigo que acabou desmaiando, por já não estar muito bem e ter muita gente no ambiente... ê Caerê, viu?! rs...

Mas nem tudo eram rosas. A cirurgia foi um sucesso, não precisei da colostomia e nem de dreno. Tudo ok. Porém, tiveram que retirar metade do meu intestino devido a extensão do tumor: quase dez centímetros! Alguns médicos se mostravam preocupados e todos nós aguardávamos o resultado da análise patológica, que indicaria o estrago do tumor. Seria feito o estadiamento do câncer, para ver a penetração e possível metástase (novos tumores decorrentes do primeiro).

A aflição pairava na minha cabeça. De certa forma, metade do problema estava resolvido... mas... e se tivesse espalhado o câncer? E se minha luta não tivesse ainda nem começado? A probabilidade da morte nunca se fez tão presente na minha vida e isso me trouxe muita introspecção. Muitas dúvidas, poucas respostas... e só a certeza de que queria viver, buscar meus sonhos. Só não sabia como.

A conversa que tive com o Oncologista responsável pela análise não foi animadora. Pelo contrário. Sem ainda analisar tudo, mas com sua experiência, o Dr. procurou me preparar para o pior, que pela extensão do tumor, provavelmente ele teria se espalhado e que eu passaria por quimioterapia, talvez por um ano, talvez por dois... ou na melhor previsão, seis meses. Um dos momentos que quase desabei foi quando ele perguntou se eu queria ter filho no futuro, pois o tratamento possivelmente me deixaria infértil... Me sugeriu procurar uma clinica de reprodução humana, para congelar meu sêmen e assim garantir a possibilidade de ser pai. Porém o procedimento era muito caro e eu deveria me decidir logo.

O Dr. Tiago, a fim de não criar falsas expectativas, procurou me informar que talvez eu ficasse mais um mês internado, que talvez eu fizesse a primeira sessão de Quimio internado... e esse prognóstico me causou cala frios. Não aguentava mais ficar preso, não sentir o vento e o sol. 

Tais notícias bateram forte na minha mente. Não conseguir ser pai? Logo eu, que tenho tanto essa vontade? Foi difícil assimilar isso, além de um monte de coisas que tinha que me preocupar. Para auxiliar a cicatrização da cirurgia foi recomendado que eu caminhasse bastante e também usasse uma cinta cirúrgica, que protege os pontos evitando que eles estourem em caso de esforço físico, espirro etc. Minha namorada me comprou a cinta, que dá firmeza e confiança para se locomover. É altamente recomendável a todos que passaram por cirurgia no abdômen. Existe também modelos que protegem o tórax, entre outros.

Cinta cirúrgica

Mas passaram-se o domingo, a segunda... e na terça feira meus anjos passaram pelo hospital para me trazer as boas novas.

Primeiro um presente simbólico do meu amigo Leny, que junto com o Rafael e Tadeu, me visitaram nesse dia especial. Era um cordão, com alguns origamis pendurados e uma pedrinha em uma das pontas. Me falta memória para lembrar o nome, mas sei que junto com aquele símbolo, vieram as notícias boas. Nesta mesma terça feita, o oncologista passou para me avisar o resultado da análise patológica: Apesar do tamanho o tumor NÃO se espalhou. Na análise de mais de cinquenta linfonodos, todos negativos. Ali, eu nascia novamente.

Dessa vez eu chorava, mas de alegria. Não importava o tratamento, eu não tinha mais a doença comigo! Teria que tomar a Quimioterapia por seis meses, mas era um tratamento preventivo, que visa eliminar qualquer resquício não identificado da doença. Seria uma luta, mas o principal já estava vencido, graças a Deus! Apesar de grande, o tumor permaneceu apenas no cólon. E eu dava graças pela doença ter se manifestado, pois em questão de profundidade na parede do intestino, o tumor chegou ao nível T3. Mais um, questão de tempo, e ele invadiria outros órgãos... Segue um link com informações da tabela TMN, que classificam os tumores, nódulos e metástase: http://www.virtual.epm.br/material/tis/curr-med/temas/med3/t3b_2000/caso12/patoest.html

E as boas notícias não pararam por aí. Após uma visita da Dr. Cinara, chefe que me operou, ficou acertado que eu passaria por uma pequena cirurgia para implante do Port-a-Cath, cateter interno que usaria para tomar a Quimio, preservando assim as veias do braço e diminuindo a dor.

Port-a-Cath 

Port-a-Cath já instalado, puncionado, recebendo medicação.

Esse tipo de cateter é implantado debaixo da pele e tem ligação com algum acesso venoso melhor que as veias do braço, que comumente estouram e prejudicam o andamento do tratamento. No meu caso, o cateter foi ligado a uma veia do pescoço. Se tiverem alguma dúvida, me procurem que explicarei com maior prazer. O uso de um cateter interno é indicado para longos tratamentos e seu custo é um pouco elevado, porém consegui pelo SUS e acredito que todos deveriam conversar com seu médico para esclarecer e solicitar, caso necessidade.

Como o texto ficou muito longo, deixo para relatar o implante e a volta para casa no próximo post. Além de uma postagem especial para meus anjos/amigos... ;)


Max BO - Tu Senhor

6 comentários:

  1. Nossa Primo, simplesmente fico sem palavras,só consigo dizer que no que eu puder, estarei do selu lado tb. Devido ao meu câncer não posso mais doar sangue, mais minhas palavras e meu testemunho estarão sempre presentes. Tb usei sonda e dreno....( no meu caso o dreno parecia não ter fim...foram puxando, puxando....sensação terrível.
    Mas Fê...TUDO PASSA, SEMPRE PASSA. DEUS SABE DE TODAS AS COISAS. E ele sabe o sofrimento de cada um em relação à essa doença e ao tratamento. SOMOS VENCEDORES...
    Fique com Deus. E bjs na LINDA da Mi.

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    1. Hey prima! Saiba que essa ajuda será recíproca, qualquer coisa mesmo é só avisar!

      Realmente, tudo passa e Deus sabe de todas as coisas. SOMOS VENCEDORES sim, graças a ele.

      Beijão!

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  2. Alguém no face divulgou seu blog e vim conhecer. Vc me inspira pra vida. Obrigada por dividir!

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    1. Obrigado mesmo pela força, Sara!
      Fico feliz em ajudar de alguma forma...

      Beijo!

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  3. Olá! que aliiiiviiiooo passar da cirurgia, sair da uti, voltar pra casa.....
    ah sua enfermeira deve ter te avisado, mas como um amigo meu fazia quimio e não sabia eu achei melhor compartilhar com você. usa bastaaaante enla (acho que é assim que escreve) no portocath qdo for fazer quimio. é uma pomadinha anestesica milagrosa. aliviava muuuuito a dor da agulhada... o que não é das piores coisas do mundo mas é bem chatinha :) estou na torcida, bjo bjo!

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    1. Poxa Fernanda, agora que vi sua dica. Vou atrás da pomada sim... muito obrigado pelas palavras também!

      Beijo, se cuida.

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