Pesquisar este blog

quinta-feira, 7 de março de 2013



Quimioterapia vs. Paternidade

"Nossa luta é pela VIDA, não tem como perder essa guerra..."
Projota - NóiZ

Com vinte e poucos anos, talvez não seja prioridade da maioria dos jovens ser pai/mãe. São outras as prioridades: faculdade, carreira, imóveis, carros, festas... Isso é natural. O que não é natural é ser privado do direito de decidir ser pai.

Um fato muito marcante durante minha internação foi a visita do médico Oncologista, responsável por analisar o tumor que removeram de mim e preparar todo o tratamento. As notícias eram preocupantes a princípio: um tumor de quase 10cm. Tiveram que remover metade do meu intestino e o diagnóstico viria em alguns dias. Dias de angústia. Mesmo que a cirurgia tenha sido um sucesso, o resultado na análise patológica poderia confirmar uma metástase. O resultado era imprevisível, devido à extensão do tumor.

Mas isso tudo já era esperado. Sabia dos riscos e possíveis consequências. A notícia que realmente me chateou foi dada de maneira tão informal... Acompanhei o Dr. até o elevador, um pouco antes de descer ele me pergunta

- Você pensa em ser pai?
- Claro que sim -respondi; por que?
- Com a quimioterapia você pode ficar infértil! Seria bom você buscar alguma clínica de congelamento de sêmen...
- Mas como, Dr.? Se vocês querem começar a quimioterapia comigo internado... e qual seria o preço de uma clínica dessa?
- Esse trabalho é caro... e eles podem vir recolher 'seu material' aqui no hospital mesmo. Talvez seja um processo reversível depois de dois, três anos...

Logo após, virou as costas, entrou no elevador e desceu. Parte de mim desmoronou neste instante. Sempre sonhei em ser pai... buscar meu filho na escola, leva-lo ao estádio do nosso time, deixar meu caráter como herança. Sempre sonhei em ajudar meu filho a resolver o dever de casa, brincar com ele... enfim, ser pai sempre foi um dos meus sonhos.

E a notícia viria num péssimo momento, pois meses atrás meu pai, meu herói até então, deixara eu e minha mãe para se aventurar pelo mundão com outra mulher. O vazio era enorme. E a possibilidade de não poder escrever uma história diferente com meu filho(a) derrubou muitas lágrimas. Minha mãe me aguardava no quarto e não entendeu o motivo do meu choro. Com muito custo expliquei a situação e tive o conforto do seu abraço.

Dias depois, em nova conversa com o Dr. eu recebi as boas novas quanto minha doença: sem metástase. Na escala TNM fique em T3N0M0 - Tumor invade a subserosa, ou além, sem envolver outros órgãos. O que significa? Que meu tumor chegou muito próximo de contaminar outros órgãos, mas não o fez. Vitória! Talvez em um ou dois anos sem ser descoberto esse câncer poderia custar minha vida, se espalhando pelo corpo. Mas Deus fez tudo da melhor maneira possível e, na prática, eu já estava curado. Digo na prática pois qualquer caso de câncer, na teoria só se afirmar resolvido depois de 5 anos de observação.

Mesmo com a boa nova me via destroçado, desamparado, sem perspectivas de futuro. Eu não poderia ser pai? A única opção viável, o congelamento, era muito cara de acordo as palavras do Dr.. O que fazer, como superar isso? Sai do hospital ainda sem entender. Apesar da alegria de passar a páscoa em casa essas dúvidas acabam comigo. Tive a felicidade de não começar o tratamento internado, pois o hospital precisava do leito e como já estava bem, fui liberado.

Era hora de agir. Me recuperar, me preparar para o tratamento e ao mesmo tempo me preocupar como resolver a situação da futura, mas muito desejada, paternidade. Sentia o peso do mundo nas minhas costas e tinha apenas três semanas para resolver tudo.

Após conseguir andar normalmente e não depender de ajudar para tomar banho ou comer, comecei a buscar clínicas de reprodução humana. Resumindo os milhões de telefonemas, sites e indicações, uma amiga sugeriu o Hospital e Maternidade Santa Joana, no Paraíso. De todos os lugares este me pareceu o  mais indicado para confiar o futuro de uma vida. Além de um ótimo custo-benefício sua estrutura é muito boa e me senti seguro.

O problema era como custear o tratamento? Apesar de mais barato, não estávamos em condição. Antes do procedimento do congelamento, são feitos exames de sorologia (para verificar doenças como Hepatite ou Aids) e não são baratos. Além disso, tinha o custo do congelamento e a manutenção (que se torna anual), totalizando algo em torno de R$1200,00. Não importava, era o futuro da minha família.

Em uma das poucas visitas do meu pai, conversei com ele sobre os custos, meus sonhos e vontade. E a resposta foi mais uma decepção: "Pra que? Hoje em dia nem compensa ter filho... se casar, curte, viaja, mas não tenha filho não...". Assim, não poderia contar nem com aquele que era meu herói. Além de me sentir abandonado no momento mais difícil da minha vida, ainda não tive apoio nesse novo desafio.

Foi complicado digerir tudo isso. Confesso que em certos momentos pensei em desistir... já estava cansado de apanhar da vida. Mas para minha família e meus amigos anjos isso não poderia acontecer e trataram de resolver tudo.

Seguindo conselhos da minha mãe e avó, passei no cartão de crédito os valores de exames e congelamento e Deus daria um jeito de conseguirmos pagar. E Deus usou seus anjos para resolver tudo. Vou utilizar as palavras que já tinha escrito em outra postagem:


"Organizada por um anjo/irmão, foi feita uma vakinha para pagar os custos do congelamento e da Quimio, como transporte e alimentação. Em um dia muito especial, me convidaram para um simples encontro. Chegando lá, amigos anjos me esperavam, com comes, bebes e muita alegria. Não entendi direito na hora, pois tinha pessoas queridas que não via a tempos. E em dado momento me foi revelado a ajuda que eles conseguiram organizar."


A surpresa foi grande, não segurei as lágrimas e senti um dos maiores momentos de alegria da minha vida. Pude, numa fração de segundos, fechar os olhos e ver o rostinho de uma criança, dormindo no meu colo. Era um sonho que se tornaria real. Eu poderia ter uma família! E, por mais distante que possa estar, meu filho(a) já tem muitos padrinhos...

Tive que adiar o começo do meu tratamento para realizar todos procedimentos necessários para o congelamento. Mas tudo deu muito certo, pude garantir o futuro da minha família e iria mais confiante para o começo da quimioterapia.

Para quem precisará passar por esse procedimento todo ou simplesmente tem curiosidade, vou explicar mais ou menos como funciona:

O congelamento de sêmen serve para preservar os espermatozóides que, congelados a baixíssimas temperaturas, mantêm suas propriedades e assim garantem a possibilidade de reprodução carregando o DNA de seu portador. No futuro, se a quimioterapia realmente me deixar estéril, poderei decidir quando descongelar minhas amostras e realizar uma fertilização assistida.

A coleta do sêmen é realizada por masturbação, pelo próprio paciente, em sala isolada. Como estímulos existem revistas e filmes pornográficos. O processo é meio desconfortável, em certa dose até engraçado, mas quando deixava a clínica e lembrava do motivo de tudo isso, valia a pena. E são necessárias, para garantir a futura fertilização, pelo menos 3 amostras, feitas em dias diferentes.

Realmente foi algo que pensei nunca precisar, mas que agradeci muito por existir. Durmo tranquilo pois sei que um dia escutarei o riso do meu bebê, independentemente de como ele será concebido.

Ser pai é uma benção que espero alcançar.

Centro de Reprodução Humana Santa Joana
Rua Dr. Eduardo Amaro, 152 - 8º andar - Paraíso
São Paulo - SP - CEP 04104 080
Tel. (11) 5573 3015 – (11) 5080 6048

No próximo post conto os detalhes de como foi enfrentar a quimioterapia. E prometo não demorar tanto para postar novamente... mas em algum momento explicarei o motivo desse hiato entre as postagens, ok?